quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Dragão do Mar - Para onde foi a arte?

Do jornal o povo.


Para onde foi a arte?

Depois da saída da Galeria do Tota, o artista Zé Tarcísio é o último dos artistas a permanecer instalado no entorno do Centro Dragão do Mar. A especulação imobiliária está entre as causas para essa debandada dos ateliês e galerias

Com a saída de Tota (abaixo), apenas o pioneiro Zé Tarcísio (acima) mantem seu ateliê no entorno do Centro Dragão do Mar (EVILÁZIO BEZERRA 31/3/2009)Com a saída de Tota (abaixo), apenas o pioneiro Zé Tarcísio (acima) mantem seu ateliê no entorno do Centro Dragão do Mar (EVILÁZIO BEZERRA 31/3/2009)
Voltemos ao final da década de 1980. Enquanto a Praia de Iracema fervilhava com os encontros multiculturais em pontos como o Cais Bar, Estoril e Pirata, um pouco mais à frente, nas proximidades da antiga alfândega, apenas casas de prostituição, galpões e velhos casarões abandonados compunham a cena do local. Prédios residenciais e restaurantes finos nem sonhavam em investir por ali, mas foi no meio dessa zona que, em 1983, o artista plástico Zé Tarcísio decidiu se instalar, ocupando o casarão deixado pelo também artista plástico Hélio Rôla. Um casarão antigo, com pé direito alto, espaçoso e aluguel baratíssimo era o ponto ideal para montar um ateliê de arte.

Depois dele - entre tantos outros -, vieram Tota, Sérgio Pinheiro, Kazane, Caetano, Mestre Pedrinho, Júlio Silveira... No início dos anos 1990, o bairro virara um polo de ateliês e galerias de artistas cearenses. Muitos se chegaram atraídos pelos mesmos benefícios de Zé Tarcísio, outros, no entanto, foram na esperança de ver sua arte deslanchar com a abertura do esperado Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, em 1999. Antônio Severino Batista, mais conhecido como Tota, foi um deles. Ele se instalou por ali em 1997. “Nós fomos com a esperança de vencer, de melhorar. O referencial da cultura do Ceará era lá”, lembra Tota.

Onze anos depois da inauguração do Centro Dragão do Mar, o equipamento que deveria ter atraído ainda mais artistas e equipamentos culturais para o seu entorno assiste a um dos últimos espaços de arte das redondezas dar adeus ao local. A Galeria do Tota acaba de fechar suas portas para reabri-la na rua Pereira Filgueiras. “Quando o Dragão foi inaugurado, eu lembro muito bem que eu fui contar as galerias de arte: tinham 28. Onze anos depois, só tinha eu e o Zé Tarcísio”, recorda o artista. “Eu não tenho nada contra o Dragão do Mar, mas não dá mais. Hoje é o ‘dragão dos bares’”, desabafa.

Daqueles tempos de abandono, Zé Tarcísio foi o único que resistiu às mudanças (e problemas) atraídas pelo Dragão do Mar para área. Ele viu o local ganhar nova vida, se encher de gente e, paralelamente, viu a especulação imobiliária fazer seus companheiros deixarem o local para dar lugar aos bares e boates. “Antes era barato, não era uma zona privilegiada. Com a criação do Dragão, a especulação imobiliária começou a querer mais dos artistas e aí foi saindo um, saindo outro...”, pontua. “O Dragão não tem culpa, ele é uma peça necessária”, ressalva.

Sérgio Pinheiro, que manteve seu ateliê por ali entre 1991 e 2007, foi um dos que precisou sair porque não tinha mais condições de pagar o aluguel. “Quando o Dragão surgiu, todo mundo quis, mas como artista não tem dinheiro, os bares ganharam”, diz. Ele conta que, na época, muitos se apegaram à ideia do então secretário de cultura do Governo do Estado e um dos idealizadores do centro cultural, Paulo Linhares, de desapropriar dois quarteirões do entorno do centro cultural para instalar o “Quarteirão dos artistas”, no qual os casarões seriam ocupados de acordo com a concessão do governo. O projeto não saiu do papel.

“O Banco Mundial se interessou, mas o Tasso [Jereissati, então governador] achou que não era prioritário na época”, explica Linhares. Para ele, o projeto ainda se faz necessário e tem urgência. “Esse projeto tem que ser feito urgentemente, senão vai degradar. O Dragão era para liderar as mudanças do entorno. A compreensão de que o Dragão precisa dessa sinergia com o entorno é necessária”, conclui.

Atual gestora do CDMAC, Maninha Moraes concorda com há urgência para resolver essas questões. “Nós temos essa preocupação, mas falta decisão política para fazermos essa articulação”, diz. É necessário uma articulação dos poderes municipal e estadual em busca de soluções para o entorno do Dragão do Mar.

O que

ENTENDA A NOTÍCIA No final da década de 1990, os casarões das ruas Dragão do Mar, José Avelino, Boris, e outros ficaram tomados por ateliês e galerias de artes. Inaugurado em 1999, o Centro Dragão do Mar atraiu ainda mais artistas para o seu entorno. Hoje, no entanto, apenas o artista Zé Tarcísio resiste à especulação imobiliária e às mudanças trazidas pelo equipamento. Para o lamento de quem viveu e vive por ali, ao invés de outros equipamentos culturais, o que se vê na redondeza são bares, boates e outros equipamentos ligados ao entretenimento.

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