quinta-feira, 4 de junho de 2009

Mais um capítulo do "a saída é a internet"

Texto do Azenha sobre o andamento dos "bastidores da informação" no Brasil.
Vejam aqui.

Pensar fora da caixa, sempre

Atualizado em 04 de junho de 2009 às 15:29 | Publicado em 04 de junho de 2009 às 13:21

por Luiz Carlos Azenha

O Inglês tem uma vantagem sobre o português: algumas expressões resumem em algumas palavras um pensamento complexo.

"Think out of the box", por exemplo, literalmente "pensar fora da caixa".

Quando alguém quer me mostrar uma reportagem de televisão sobre um tema que ainda pretendo abordar na TV eu sempre reajo com reticência: tenho medo de me tornar prisioneiro do "trem de pensamento" de outra pessoa.

"Trem de pensamento", "pensamento dentro da caixa".

Significam quase a mesma coisa. "Pensar dentro da caixa" significa pensar de forma convencional, de acordo com parâmetros e paradigmas conhecidos e atuais. "Trem de pensamento" é o mesmo que "linha de raciocínio". É como se o cérebro entrasse em um estado de letargia e, para evitar esforço extra, apenas reproduzisse o que tem no arquivo. É muito comum em quem trabalha na TV, especialmente quando você tem apenas 90 segundos para "contar um causo".

Tempos extraordinários requerem idéias extraordinárias.

O que está tornando a nossa mídia corporativa irrelevante? O fato de que ela não ousa. Os feitores patronais impõem a "linha editorial" rigorosamente, de cima para baixo. Os jornalistas, que estimulados são uma turma extremamente criativa e não convencional, adotam o mode morte cerebral.

Outros fatores contribuíram para este estado letárgico:

1) Jornalista hoje é de classe média. Na USP, na PUC, na Metodista, o objetivo de uma boa parte dos estudantes de Jornalismo é "aparecer na Globo". Como diz o Leandro Fortes, os cursinhos promovidos pela Abril, pela Folha e pela Globo visam formar monstrinhos na incubadeira. São raríssimos os professores que estimulam o senso crítico da garotada. Pensando de forma convencional eles ganharão salários convencionais. Vão carregar piano para as "estrelas" da mídia.

2) A aquarização das redações, já notada por outros jornalistas, como o Luís Nassif. Por que um jovem repórter da Globo vai pensar, discutir e debater a questão das cotas raciais, por exemplo, se ele sabe que jamais conseguirá expressar qualquer ponto-de-vista na emissora que não seja o do Ali Kamel? O poder na mão de poucos dentro das redações garante uma "linha editorial" mais coerente. Mas isso não compensa a perda em criatividade. Ou em pluralismo de idéias. É por isso que o Viomundo celebra os internautas que deixam opiniões divergentes: para arejar o ambiente, para provocar confronto de idéias, para evitar "panelinha ideologica". Sou fã dos provocadores por isso. Eles nos fazem pensar.

3) O corte de custos e a adoção de "metas de produtividade". O corte de custos elimina os jornalistas com maior tempo de serviço, experiência e formação. Em geral, eles é que davam treinamento informal para os mais jovens nas redações. Agora, não. O garoto de 20 anos de idade faz o cursinho da Abril e se acha. Esse garoto é um "achado" para os chefetes. Obedece cegamente. E os chefetes muitas vezes trabalham com "metas de produtividade". Falo dos salários extras que são pagos na Globo, por exemplo, àqueles que ocupam cargos de confiança, no fim do ano, se a empresa cumprir as metas orçamentárias. A certa altura o objetivo é cortar custos para cumprir as metas. Jornalismo? Que se exploda. Meu negócio é cumprir as metas, embolsar o salário ou salários extras e o mundo que se dane. É o Jornalismo "cabeça de planilha".

As três questões que abordei acima aprofundam o fosso entre a mídia corporativa e os leitores/ouvintes/telespectadores, especialmente no momento revolucionário que vivemos, por conta das novas tecnologias da informação e da crise econômica transformadora do capitalismo mundial.

O modelo tradicional, em que a mídia exercia "autoridade" sobre o público, está se rompendo. Costumo falar em minhas palestras sobre os textos que assino no Viomundo, que se transformam ao longo do dia. Eu escrevo às 6 da manhã. Às dez da noite aquele texto foi transformado COMPLETAMENTE pelo acréscimo dos comentários, que me corrigem, criticam, acrescentam idéias e informações.

Aceitar que o leitor seja "um igual" exige sacrificar autoridade -- um exercício que poucos jornalistas estão dispostos a fazer. Afinal, é essa "autoridade" que eles acreditam vender para os patrões e os colegas. O jornalismo colaborativo é mais do que uma técnica. Exige uma mudança de filosofia para os envolvidos, muitos dos quais são profissionais com décadas de carreira.

Momentos como o que vivemos, no entanto, exigem isso: "pensar fora da caixa". Alguns leitores se assustam quando descobrem, no site, artigos que consideram "radicais". Ora, se vocês querem ler a Folha, leiam a Folha. Se querem ver a Globo, vejam a Globo. O objetivo deste espaço é justamente o de oferecer pontos-de-vista que você não vê na mídia tradicional, que provoquem debate e façam você pensar. Se possível, "fora da caixa". Para pensar "dentro da caixa" já tem os alunos dos cursinhos da Abril, da Folha e da Globo.

Na lógica que eles entendem: "Vão conseguir emprego primeiro, mas lá na frente vão carregar piano para os que pensaram fora da caixa".

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Não se utilizem de comentários ofensivos, que utilizem expressões de baixo calão ou preconceituosas. A bodega é livre, mas exige respeito.